terça-feira, 12 de outubro de 2010

Tudo que vai

Postado por Camilla Fernanda às 22:32

Oi, L escrevi pra dizer que lembrei de você.
Passei horas tentando pensar em como começar essa carta e decidi que começaria pelo motivo que me fez te escrever. E foi isso, ter lembrado de você. Não que eu não tivesse lembrado antes, eu sempre lembro, só que dessa vez a lembrança veio acompanhada de uma angústia. Angústia essa que me dominou no meio do dia e me fez correr desesperadamente atrás de um caderno pra copiar meus pensamentos, antes que todos eles fugissem. Ahh vai, você sabe que escrevo sobre quase tudo que me acontece e sempre transformo num texto dramático e meio triste,só pra combinar comigo, você sabe.
Enfim, depois que você foi embora, tudo mudou. Eu que nunca me adapto bem a mudanças, aliás sempre morro de medo delas, não gostei nada disso. Eu morri várias vezes, tentei até me consolar repetindo sem parar que você precisava ir, que evoluir na vida é sempre bom e que eu sempre te apoiei tanto não era agora que ia te desencorajar. Mas tenho que confessar que não foi fácil e ainda não é, acho até que nunca será. 10 anos de convivência diária não se superam assim. Mais de um ano já se passou e eu nem ao menos me adaptei.
Lembro do primeiro dia que te vi. Você tinha olhos de menina, olhos de menina de 13 anos em um corpo de 15 . Eu era muito mais criança que você (tinha apenas 10 anos), mas seus olhos sempre foram mais inocentes. Era uma inocência de menina do interior, que menina da cidade nenhuma consegue imitar.
Lembrei também que uma vez você me disse ainda lembrar desse dia, você disse que eu cheguei de repente com a minha roupa de Ballet, disse que eu era sorridente e um tanto gordinha.
A gente se tornou tão amiga, eramos cúmplices. Você nunca gostou de fazer nada sozinha e era sempre eu que te acompanhava. Na hora de acordar e de dormir, era sempre a sua companhia que eu tinha. Você me fazia parecer menos só com as suas reclamações infinitas.
Hoje em dia eu ando pela casa e falo sozinha, falo com espelho, falo com qualquer coisa, pra tentar esquecer da sua ausência, pra tentar enlouquecer menos. E ás vezes até esqueço de você. É, esqueço. De tanto lembrar eu acabo esquecendo, acho que meu cérebro bloqueia pra evitar sofrimento. Essa é a minha teoria.
Vez ou outra você me liga, ( eu nunca ligo, você sabe disso) e pergunta como eu estou, como andam as coisas, cobra a minha visita, reclama que eu sempre prometo e nunca vou, pergunta por Belinha e Zeus e me fala um pouco de você.Nossa conversa entrou naquela de ser formal, de perguntar coisas óbvias e até repetidas. Termina eu jurando que vou te visitar, você fingindo acreditar. Nos despedimos e tudo fica (quase) bem.
Tem um escritor aí que eu gosto muito, um tal de Caio Fernando Abreu, ele escrevia coisas ótimas, em um dos textinhos ele dizia assim:
"Uma pessoa, quando está longe, vive coisas que não te comunica, e tu, aqui, vive coisas que não a comunica. Então, vocês vão se distanciando e, quando vocês se encontrarem, vocês vão se falar assim: oi, tudo bom e tal, como é que vão as coisas? E aí ele vai te falar, por cima, de tudo que ele viveu, e, não sei, vai ser uma proximidade distante. Não adianta, no momento que as pessoas se afastam, elas estão irremediavelmente perdidas uma da outra."
 Entende? Podemos nos falar sempre, mas nada será como antes, temos uma proximidade distante, é isso que dói. Saber que nunca mais seremos quem costumávamos ser é o que assusta, corrói e desespera. Saber que você não vai chegar pela porta e reclamar que deixaram o portão aberto, dizendo que qualquer hora entra um assaltante e leva tudo. Você não vai dizer que o teu estômago tá te matando e eu não vou poder te assustar com as minhas explicações pseudo-científicas, te obrigando a ir ao médico tratar isso direito. É isso que dói.
O que dói é o que não ficou. É o CD de Mamonas Assassinas e o de Roupa Nova. É a tua gaveta sempre arrumada. É a tua imagem sentada na cadeira perto da porta da cozinha. É você me calçando pra ir a escola quando eu fazia 3° série.Tudo isso está perdido em algum lugar do tempo, em qualquer lembrança nossa, em tudo que me lembra você.
Mas eu não te escrevi pra falar de dor. Escrevi pra te dizer que apesar de tudo eu vivo normalmente, ainda vou na igreja, fico muito tempo no computador e durmo muito tarde. Ainda sou louca por doce, adoro coca-cola e não tô namorando. Ainda escuto aquelas músicas loucas que você odiava, ainda sou caseira, meu guarda-roupa ainda é sempre bagunçado e continuo péssima na cozinha.
 Enfim, ainda sou eu. Depois desse tempo todo, eu mudei, cresci, aprendi muita coisa, mas ainda se trata de mim.
Eu te escrevi pra dizer que sinto falta de muita coisa, mas de você eu sinto saudade.SAUDADE que é palavra da língua portuguesa que ninguém consegue explicar, que é um sentimento ambíguo que ninguém consegue ser justo ao tentar definir. Eu é que não vou tentar. Só escrevi mesmo para que você soubesse o que sinto. Só escrevi pra dizer o quanto foi, é e será difícil sem você aqui.É isso...

A Dani sempre te manda um beijo e eu acho que te amo.
Quando tiver um tempinho me liga ! 


P.S: L se trata de uma grande amiga que morou comigo 10 anos. 

3 comentários:

Anônimo disse...

Owww que lindo, tu te expressa muuuito bem escrevendo. Pude sentir um pouco o que tu quis passar pq já passei algo parecido. Ralmente, as coisas mudam e não ficam como era antes.

Beeeijos da tua fã número um o/

.Sté. on 13 de outubro de 2010 às 12:49 disse...

CAMMMMMMMMMM adoro teus posts, tu sabe né?
Saudades daí.

Greyce Kelly Cruz on 13 de outubro de 2010 às 23:01 disse...

Lembro dessa música de Capital Inicial cujo nome tem tudo a ver com seu texto:
Tudo Que Vai

Hoje é o dia
E eu quase posso tocar o silêncio
A casa vazia.
Só as coisas que você não quis
Me fazem companhia
Eu fico à vontade com a sua ausência
Eu já me acostumei a esquecer
Tudo que vai
Deixa o gosto, deixa as fotos
Quanto tempo faz
Deixa os dedos, deixa a memória
Eu nem me lembro
Salas e quartos
Somem sem deixar vestígio
Seu rosto em pedaços
Misturado com o que não sobrou
Do que eu sentia
Eu lembro dos filmes que eu nunca vi
Passando sem parar em algum lugar.
Tudo que vai
Deixa o gosto, deixa as fotos
Quanto tempo faz
Deixa os dedos, deixa a memória
Eu nem me lembro mais
Fica o gosto, ficam as fotos
Quanto tempo faz
Ficam os dedos, fica a memória
Eu nem me lembro mais
Quanto tempo, eu já nem sei mais o que é meu
Nem quando, nem onde...

siga cantando, é uma boa disfarçada!

 

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